quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Saudades da minha infância


Tenho saudades da minha infância. Tínhamos tão pouco, mas tínhamos tanto. As poucas coisas que faltavam só eram lembradas nesta época do Natal. Ter um autinho plástico, com rodinhas, era um sonho. Uma bola de couro ou então uma pasta, também de couro, para carregar os cadernos, igualmente, estavam fora das nossas possibilidades. Mas, como não conhecíamos a palavra estresse, isso não atrapalhava em nada. Jogávamos futebol com bolas de meias cheias de trapos e o material escolar se acomodava tão bem nos sacos plásticos do Cristalçucar.

Na vila onde me criei, todas as famílias eram pobres. A minha nem casa própria tinha. Mesmo assim, éramos todos felizes. A criançada nem se fala. Até os adultos pareciam muito mais felizes, embora não tivéssemos o conforto que temos hoje.

Na falta da televisão, nas noites quentes de verão, uma boa prosa, uma roda de chimarrão, um toque de gaita e violão. E se o gaiteiro fosse bom, logo havia dois, três casais dançando. E nós, a gurizada, fazíamos de toda a vila o quintal de nossas casas.

Enquanto a gente grande proseava, depois de encher as mãos de cucas, broas ou dos sequilhos da vovó, nós, meninos e meninas sumíamos entre o casario e os pomares numa brincadeira de esconde-esconde. Uns mais corajosos se embrenhavam no mato de eucaliptos ou no capão que circundavam a vila. Às vezes se ia tão longe do “ferrolho” que mal se ouvia a voz do contador: “Um, dois, três (...) nove, dez. Lá vou eu, quem não tá pronto é meu.” Aí, percebíamos que terminara a contagem pelo frenético choro de um dos menores (estreante no brinquedo) que, por não saber se esconder, era logo descoberto e não se conformava com a derrota.

Em dezembro iniciavam as férias na escola e aumentavam os compromissos em casa. Sempre havia um galinheiro para limpar, uma talha de lenha para guardar, a sombra de um caramanchão enorme para varrer, mas sempre sobravam os fins de tarde para umas traquinagens.

Não faltava parceria para uma caçada de preás ou para pegar passarinhos. Quando o calor era demais, o jeito era represar o riacho para um bom banho. E quando a água serenava, depois de todos exaustos, surgiam os lambaris que até pareciam felizes porque lhes proporcionávamos um espaço mais profundo para nadar. Mas a alegria deles durava pouco, pois logo aparecia um moleque com uma latinha velha e começava a caça aos peixinhos.

Naquela época, caçávamos, pescávamos, cortávamos árvores, mas não produzíamos lixo e destruição como hoje. Não se via pássaros mortos no quintal porque o vizinho colocou veneno para terminar com o inço no seu pátio. Onde houvesse inço indesejado, a gurizada capinava. Nos riachos havia peixes e podíamos tomar banho, pois o esgoto de nossas casas não era jogado neles.

Não se falava em violência, não se falava em trabalho infantil, nem em poluição, muito menos em crianças desrespeitando pais e professores. Ganhamos conforto e perdemos alguns costumes fundamentais nesses últimos anos. Por que será que isso aconteceu?

Tivemos tantos avanços nesses últimos 50 anos, avanços tecnológicos, de infraestrutura. Um simples clic no computador nos conecta com um familiar que está lá longe. Tá calor, liga-se o ar condicionado, ou vamos para a beira da piscina. Ou quem sabe, pegamos “uma” mais gelada ali no freezer.

Será que as redes sociais conseguem substituir as antigas reuniões em família? E onde estão os lambaris nessa piscina? E o que vale mais, uma cerveja estupidamente gelada para ser tomada sozinho, ou uma garrafas de vinho que era resfriado amarrado em uma cordinha, dentro do poço, para ser repartida entre os amigos?

Longe de mim a ideia de abrir mão dos confortos atuais, mas tenho certeza que a felicidade plena só voltará quando reaprendermos o valor do convívio entre as pessoas.

2 comentários:

Carlos Schneider disse...

Nando...
Realmente nas coisas simples que encontramos as belezas da vida que em algum momento deixamos para traz. Parabéns pelo artigo.

angel disse...

Fernando tenho lembranças felizes deste tempo,no meu caso colhiamos pitanga,butiá,bricavamos nos campos perto de casa.não tinhamos energia eletrica mas tinhamos tanto com o q brincar.com certeza meu filho teve muitas mais mas nao creio q a infancia dele tenha sido melhor que a minha.